O Código Penal, no art. 42, determina que Computam-se, na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos referidos no artigo anterior.”

Entretanto, em interpretação extensiva ao artigo referido, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento do Habeas Corpus n.º 455.097 reconheceu a possibilidade de detrair a pena aos sujeitos que cumpriram medidas cautelares de recolhimento noturno, aos finais de semana e feriados, supervisionados por monitoramento eletrônico. 

Ementa da decisão: 

HABEAS CORPUS. PENAL. MEDIDA CAUTELAR DE RECOLHIMENTO NOTURNO, AOS FINAIS DE SEMANA E DEMAIS DIAS NÃO ÚTEIS (FISCALIZADA, NA ESPÉCIE, POR MONITORAÇÃO ELETRÔNICA). DETRAÇÃO. PRINCÍPIO DA HUMANIDADE. ESPECIAL PERCEPÇÃO DA PESSOA PRESA COMO SUJEITO DE DIREITOS. ÓBICE À DETRAÇÃO DO TEMPO DE RECOLHIMENTO DOMICILIAR DETERMINADO COMO MEDIDA SUBSTITUTIVA DA PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE EXECUÇÃO. MEDIDA CAUTELAR QUE SE ASSEMELHA AO CUMPRIMENTO DE PENA EM REGIME PRISIONAL SEMIABERTO. UBI EADEM RATIO, IBI EADEM LEGIS DISPOSITIO. HIPÓTESES DO ART. 42 DO CÓDIGO PENAL QUE NÃO SÃO NUMERUS CLAUSUS. PARECER MINISTERIAL ACOLHIDO. ORDEM DE HABEAS CORPUS CONCEDIDA. 1. A detração é prevista no art. 42 do Código Penal, segundo o qual se computa, “na pena privativa de liberdade e na medida de segurança, o tempo de prisão provisória, no Brasil ou no estrangeiro, o de prisão administrativa e o de internação em qualquer dos estabelecimentos referido no artigo anterior”. 2. Interpretar a legislação que regula a detração de forma que favoreça o Sentenciado harmoniza-se com o Princípio da Humanidade, que impõe ao Juiz da Execução Penal a especial percepção da pessoa presa como sujeito de direitos. Doutrina. 3. No clássico Direito e Razão, Ferrajoli esclareceu a dupla função preventiva do Direito Penal. De um lado, há a finalidade de prevenção geral dos delitos, decorrente das exigências de segurança e defesa social. De outro, o Direito Penal visa também a prevenir penas arbitrárias ou desmedidas. Essas duas funções são conexas e legitimam o Direito Penal como instrumento concreto para a tutela dos direitos fundamentais, ao definir concomitantemente dois limites que devem minimizar uma dupla violência: a prática de delitos é antijurídica, mas também o é a punição excessiva. 4. O óbice à detração do tempo de recolhimento noturno e aos finais de semana determinado com fundamento no art. 319 do Código de Processo Penal sujeita o Apenado a excesso de execução, em razão da limitação objetiva à liberdade concretizada pela referida medida diversa do cárcere. 5. A medida diversa da prisão que impede o Acautelado de sair de casa após o anoitecer e em dias não úteis assemelha-se ao cumprimento de pena em regime prisional semiaberto. Se nesta última hipótese não se diverge que a restrição da liberdade decorre notadamente da circunstância de o Agente ser obrigado a recolher-se, igual premissa deve permitir a detração do tempo de aplicação daquela limitação cautelar. Ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio: onde existe a mesma razão fundamental, aplica-se a mesma regra jurídica. 6. O Superior Tribunal de Justiça, nos casos em que há a configuração dos requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, admite que a condenação em regime semiaberto produza efeitos antes do trânsito em julgado da sentença (prisão preventiva compatibilizada com o regime carcerário do título prisional). Nessa perspectiva, mostra-se incoerente impedir que a medida cautelar que pressuponha a saída do Paciente de casa apenas para laborar, e durante o dia, seja descontada da reprimenda. 7. Conforme ponderou em seu voto-vogal o eminente Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, o réu submetido a recolhimento noturno domiciliar e dias não úteis – ainda que se encontre em situação mais confortável em relação àqueles a quem se impõe o retorno ao estabelecimento prisional -, “não é mais senhor da sua vontade”, por não dispor da mesma autodeterminação de uma pessoa integralmente livre. Assim, em razão da evidente restrição ao status libertatis nesses casos, deve haver a detração. 8. Conjuntura que impõe o reconhecimento de que as hipóteses do art. 42 do Código Penal não consubstanciam rol taxativo. 9. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça deliberou que a soma das horas de recolhimento domiciliar a que o Paciente foi submetido devem ser convertidas em dias para contagem da detração da pena. Se no cômputo total remanescer período menor que vinte e quatro horas, essa fração de dia deverá ser desprezada. 10. Parecer ministerial acolhido. Ordem de habeas corpus concedida, para que o período de recolhimento domiciliar a que o Paciente foi submetido (fiscalizado, no caso, por monitoramento eletrônico) seja detraído da pena do Paciente, nos termos do presente julgamento. (HC n. 455.097/PR, relatora Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, julgado em 14/4/2021, DJe de 7/6/2021.)

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