Depois que o juízo de primeiro grau da 2ª Vara Criminal da Comarca de Cabo Frio decretou a prisão preventiva do réu, “ex officio”, em razão do Oficial de Justiça não tê-lo localizado para intimar da data do julgamento no Tribunal do Júri, a Defesa do acusado impetrou Habeas Corpus (n.º 0020855-29.2022.8.19.0000) junto ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que revogou o decreto da prisão cautelar, com o fundamento de que o fato de o acusado não ter sido encontrado para intimação pessoal não pode ser utilizado como único fundamento para a sua constrição cautelar, de acordo com jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª T., RHC 121400/MG, julg. em 11.02.2020).

A ementa do acórdão ficou assim:

Habeas corpus. Decreto de prisão preventiva. Imputação de homicídio qualificado pelo motivo fútil. Writ que sustenta a ilegalidade da prisão preventiva, eis que decretada de ofício pela apontada Autoridade Coatora. Hipótese que se resolve em favor da impetração. Paciente que, em tese, desferiu vários golpes de faca em sua ex-companheira, por motivo de ciúmes (já que ela estaria mantendo relacionamento amoroso com outro homem), provocando-lhe lesões que foram a causa eficiente de sua morte. Apontada ilegalidade que há de ser reconhecida na espécie, a despeito da extremada gravidade do injusto imputado. Prisão preventiva que, após a introdução do art. 3º-A ao Estatuto Processual Penal e a supressão do termo “de ofício” que constava do art. 282, §§ 2º e 4º, bem como do art. 311, ambos do CPP, não pode mais ser decretada de ofício pelo juiz, devendo haver, portanto, prévia provocação do Ministério Público, da autoridade e policial ou, quando for o caso, do querelante ou do assistente do MP (STJ). Ministério Público que, na espécie, teve a oportunidade de se manifestar acerca da não localização do Paciente, após três tentativas frustradas de intimação para comparecer à sessão plenária do Tribunal do Júri, e não veiculou qualquer requerimento para decretação da prisão preventiva ou aplicação de outra medida cautelar de menor restritividade. Juízo a quo que, nada obstante, achou por bem decretar a prisão preventiva do Paciente, “ex officio”, ao arrepio da vedação expressa contida no art. 311 do CPP, não havendo sequer notícias de que o Ministério Público tenha se manifestado, a posteriori, favoravelmente à medida cautelar extrema, de forma a suprir o vício da inobservância da formalidade de prévio requerimento. Firme orientação dos Tribunais Superiores no sentido de que “a Lei nº 13.964/2019, ao suprimir a expressão “de ofício” que constava do art. 282, §§ 2º e 4º, e do art. 311, todos do Código de Processo Penal, vedou, de forma absoluta, a decretação da prisão preventiva sem o prévio “requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial ou mediante requerimento do Ministério Público” (grifei), não mais sendo lícita, portanto, com base no ordenamento jurídico vigente, a atuação “ex officio” do Juízo processante em tema de privação cautelar da liberdade.” Custódia prisional que igualmente não se sustenta, frente aos requisitos do art. 312 do CPP. Espécie que versa sobre fatos ocorridos há mais de 10 (dez) anos. Paciente que responde ao processo solto desde o ano de 2013, quando teve a custódia preventiva substituída por medidas cautelares alternativas, em face da alegada insubsistência dos requisitos para manutenção da segregação cautelar (cf. sentença de pronúncia). Inexistência, na decisão impugnada, de qualquer registro quanto à eclosão de fato novo verdadeiramente justificador da superveniente custódia. Eventual dificuldade na localização do Paciente que, por si só, não se alça como fundamento idôneo para a decretação de sua custódia superveniente. Advertência do STJ no sentido de que “o simples fato de o acusado não ter sido encontrado para citação pessoal não pode ser utilizado como único fundamento para a sua constrição cautelar”. Constrangimento ilegal que se remedia, com a ressalva de ser viável a decretação da prisão preventiva, desde que assentada em motivo concreto superveniente e ressonante no art. 312 do CPP, pressupondo, em síntese, “a existência de fatos novos capazes de comprovar a imprescindibilidade do recolhimento ao cárcere” (STJ). Ordem que se concede, a fim de relaxar a prisão do Paciente, determinando-se a imediata expedição de alvará de soltura.

Faça download acórdão: acordão HC 0020855-29.2022.8.19.0000 – RJ

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